sábado, 2 de junho de 2012

Ah!...Esse nosso Brasil! (Parte II)


A propósito dessa brigarada toda, não posso deixar de registrar uma nova indignação.
A maior parte da celeuma se trava na blogosfera. Nela se degladiam vários jornalistas e outros intelectuais, todos de menor expressão. Quase nenhum deles é isento. Pelo contrário, acusam-se mutuamente – em geral com razão – de estarem comprometidos com um ou outro lado da refrega.
Estes daqui “recebem dinheiro de empresas governamentais”, e, então, “são sabujos do PT”. Por isso, estão na canoa 1 (aquela que diz que o "mensalão" não passa de uma farsa, que a CPI do Cachoeira só deve investigar os políticos tucanos, e outras “cositas” do gênero).
Aqueles de lá são “reconhecidamente neo-liberais e entreguistas”, razão pela qual não poderiam navegar senão na canoa 2, e denunciar espalhafatosamente o que chamam de “lulo-petismo”, além de advogar intransigentemente a apuração rigorosa e imediata do “mensalão”, e menosprezar as ligações “Cachoeira-Demóstenes Torres”.
Então, sabidos os compromissos de cada um, os descontos a serem dados são de tal magnitude que a briga se restringe a uma baixaria insuportável.
Ocorre, entretanto, que os interesse em jogo são maiores, muito maiores, do que isso.
Está na berlinda nada menos do que a maior revista semanal do País. E, com ela, toda a nossa grande imprensa, seu papel na democracia, sua ética e, por incrível que pareça, seus limites (será que existem?)
Ou seja: a CPI do Cachoeira, querendo ou não, vai ser obrigada a tomar decisões que representarão um marco histórico do Brasil.
Vai precisar dar respostas a perguntas que não querem calar, e que são mais ou menos as seguintes: deve ou não deve a grande imprensa responder pelos seus atos perante a sociedade? Estão ou não estão os jornalistas (principalmente aqueles da mídia de grande alcance) acima dos cidadãos comuns? Ou da lei? Quais os limites éticos do exercício profissional, nessa área, se é que existem?
Digo que tais decisões são obrigatórias porque chegamos a um ponto em que a CPI não pode mais fugir delas. Trata-se de questão posta.
O Brasil inteiro sabe que o bandido utilizou-se abertamente da revista Veja, através principalmente de seu editor-chefe brasiliense, o jornalista Policarpo Junior, para atacar e destruir seus inimigos e, com isso, evidentemente, beneficiar-se e, por extensão, à sua organização criminosa.
O Brasil inteiro sabe que a Veja prestou-se a esse jogo, e sabe que o fez por dois motivos: um, que os inimigos do bandido eram também seus inimigos, e que, portanto, destruí-los era também seu interesse; e dois que as informações que o bandido lhe fornecia (e que obtinha por meios nem sempre legais – o que, aliás, a Veja sabia mas fingia ignorar) garantiam “furos” de reportagem que proporcionavam aumento de venda e lucro (ah, o “dindim”...!).
Por isso, descarregou seu imenso poder sobre os inimigos de Cachoeira e os destruiu, um a um. Sabia, claro, que com isso também beneficiava a organização criminosa desse bandido, o Cachoeira, seu parceiro.
O Brasil inteiro sabe que, mesmo ciente disso, a revista Veja não denunciou a organização criminosa que beneficiava, justamente porque se o fizesse estaria matando a “galinha dos ovos de ouro”, para ela duplamente valiosa.
O Brasil inteiro percebeu que quando explodiu o escândalo das fitas gravadas pela Polícia Federal, expondo as entranhas podres da amizade entre o bandido Cachoeira e o Senador Demóstenes Torres, até então o mais notório “guardião” da ética política no Brasil (alguém o chamou jocosamente, dia desses, na internet, de “o último Varão de Plutarco”...) a revista Veja adotou uma postura discreta, quase ignorando o tema.
Tratou a questão de forma totalmente distinta das anteriores, quando crucificou de maneira implacável os políticos flagrados em falsete.
Só faltou silenciar. Não o fez, mas quase. Enquanto pode, relegou o tema a pequenas matérias, escondidas nas páginas internas. Pior: lavradas com palavras de uma suavidade pueril, quase virginal.
Capa? Nem pensar.
Mesmo sendo um escândalo muito maior e mais grave do que muitos daqueles outros aos quais a revista dedicou edições quase apoplécticas.
Os exemplares dela, da época, estão por aí, para quem quiser olhar com olhos de ver.
Sua atitude “dois pesos e duas medidas”, escancarada, vergonhosa, embora, claro, não se justifique, se explica facilmente.
É que os dois principais envolvidos no escândalo não figuram propriamente no rol de seus inimigos.
Pelo contrário.
Cahoeira, como já vimos, foi por longo tempo, seu parceiro. Pode-se dizer até, pelo teor de algumas conversas já dadas a público pela Polícia Federal, que foi seu mentor. Chegava a determinar em qual setor da revista deveria ser publicado este ou aquele assunto que fornecia a ela .
E Demóstenes, este, além de representar o pensamento ideológico retrógrado dos donos da revista no Congresso, ainda por cima o fazia com postura irretocável, incorruptível!
Basta ler a Veja retroativamente, a partir de quando o escândalo eclodiu, para conhecer a admiração que dedicava ao Senador. Tinha-o realmente como um Varão de Plutarco, o supremo guardião da moralidade.
Promovia-o de modo a fazer com que o Brasil soubesse que quando alguém desejasse aprender a fazer política séria, era a ele que deveria se voltar.
E então... a casa caiu.
Temos, portanto, a seguinte equação: o objetivo expresso da CPI é apurar as relações espúrias do bandido Carlinhos Cachoeira em todos os setores da vida nacional, principalmente com políticos e empresários.
Natural – pois não? – que se debruce sobre os vínculos mais que duvidosos dele com a revista Veja. Que, por óbvio pertence a uma empresa, a Editora Abril. Não é mesmo? Pois é.
                   Há um grande e surdo clamor para que faça isso.
Só que, se o fizer, vai colocar na ordem do dia, através da Veja, toda a imprensa. Qual o seu papel? Quais os seus limites? Há limites?
Ora, obviamente ela, a imprensa, não tem o menor interesse nisso. Quer continuar na boa, mandando e desmandando, como tem feito até agora.
E é por isso, meu caro leitor (sei que há pelo menos um, por aí), que o tal clamor do qual eu falei é surdo.
                  Você talvez nem mesmo saiba dele, é ou não é? Mas, acredite, ele existe.
Você tem visto, entretanto, algum grande veículo noticioso falar neste assunto? Não? Nem eu.
Como você, a maior parte das pessoas sequer sabe que isso está na baila.
Será que é porque não é importante? Ou porque é pouco importante?
Eu, pelo menos, não acho isso. Pelo contrário, penso que é muito, muitíssimo importante. Essencial mesmo. E você, o que acha?
Mas não aparece. Pelo contrário. Dá a impressão de que nem existe.
Com exceção da revista Carta Capital, que sempre tenta uma linha diferente, e da TV Record, que dias atrás fez uma bela matéria mostrando tudo (que ironia, hein?!, termos que depender do Bispo Macedo para vermos um pouco de verdade vir à tona neste País...) e aliás já sofre represálias por isso de suas co-irmãs, o silêncio é absolutamente sepulcral!
Criou-se um escudo de chumbo, de auto-proteção. Uma coisa de verdadeira omertá (a lei de “honra” e segredo que os mafiosos usam para protegerem uns aos outros).
Mesmo assim, a CPI não tem saída a não ser posicionar-se sobre a questão. Expressa ou tacitamente, ela o fará, queira ou não.
A questão está posta e a demanda existe. Não tem como fugir.
Mesmo se resolver não se pronunciar, terá decidido. A própria omissão será, com certeza, uma tomada de posição.
Significará que o Congresso Nacional, ele próprio uma das mais martirizadas vítimas da nossa imprensa inescrupulosa (às vezes com justiça, mas com certeza nem sempre!), terá se vergado a ela de forma humilhante, abrindo mão de seu papel mais importante, que é o de dar voz à sociedade. Terá renunciado à oportunidade histórica de servir de farol orientador da democracia brasileira na noite até então vivida por um de seus  vetores mais delicados.
Se  a revista Veja estiver correta, nem ela nem seus pares devem temer a exposição na CPI. Por que, então, o lobby do silêncio? Por qual razão já nem mesmo na própria CPI se fala mais no assunto?
Caso contrário, o Brasil merece ser esclarecido, o erro - que seria gravíssimo - precisaria ser corrigido, e os culpados rigorosamente punidos, doesse a quem doesse. Além disso, seria preciso aprender com esse erro, e criar sistemas que evitassem sua repetição.
Assim é que se aperfeiçoa a democracia.
E não, absolutamente, criando feudos de poder, quaisquer que eles sejam, nos quais se encastelam pessoas que se julgam acima das outras e da própria lei.
              E, o que é ainda muito pior, que lamentavelmente são desta forma  reconhecidos e tratados por alguns.

(continua...)

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