sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Há esperança!

"Só conseguiram reduzir a criminalidade as nações que aliaram diminuição de punições com aumento de políticas de dignificação humana e geração de bem estar social".

(Adel El Tasse, procurador federal, professor de Direito Penal, coordenador da Associação Brasileira dos Professores de Ciências Penais no Paraná, na Gazeta do Povo de hoje, 28/09, pg. 2.)

A frase adquire ainda maior relevância por ser da lavra de um integrante do Ministério Público, ao qual, como se sabe, cabe acusar e pedir a condenação dos criminosos.

            Viva! Estamos caminhando para a frente. Cada vez mais pessoas estão começando a entender.

sábado, 22 de setembro de 2012

Meu Ponto de Vista - 8 - População Carcerária - Final


Então, dizia eu, que diabos fazer?
Respondo: alterar radicalmente o enfoque.
Estamos atrelados a uma visão ortodoxa, tradicional, burra mesmo, porque cristalizada no hábito das pessoas a ponto de simplesmente impedi-las de questioná-la. É a síndrome do “sempre foi assim”, que não dá a mínima para as mudanças que a vida traz todos os dias, as quais exigem novas abordagens críticas.
Essa visão acrítica teima em ignorar as causas do problema, atacando tão somente seus efeitos.
O resultado é que ele se torna simplesmente inadministrável.
 Vejamos.
Há uma óbvia defasagem negativa entre a capacidade da administração pública de gerar vagas físicas destinadas a abrigar pessoas privadas de liberdade, e o número dessas pessoas.
Este último é de tal ordem que desafia permanentemente os recursos públicos e mesmo a logística natural, representada pelo lapso de tempo necessário a qualquer obra, mormente a pública.
Reduzida à sua essência, a questão pode ser – de forma obviamente analógica, figurada – descrita como o mais tradicional postulado econômico, a lei da oferta e da demanda.
São, portanto, duas variáveis: 1 - a capacidade da administração de construir as instalações que produzam as vagas (oferta); e 2 – o número de pessoas que precisam ocupá-las (demanda).
Diante disso, o que faz a administração pública? Olha exclusivamente para a primeira variável. Busca desesperadamente meios de aumentar a oferta, aperfeiçoando sua capacidade de construir as tais instalações.
Sequer lhe ocorre agir no sentido de reduzir a demanda.
No entanto, é aí que está a saída. A meu ver, a única saída.
É esta a direção que pode levar à solução do problema. Ou, pelo menos, à sua redução a um nível capaz de ser administrado.
A parte principal do mesmo problema não está, portanto, na necessidade e quantidade de vagas a serem ofertadas pelo sistema, mas, sim, no número de pessoas que existem para ocupá-las, que já é enorme, e só faz aumentar.
Este é a sua causa. Aquelas, a consequência, o efeito.
Tudo isso, evidentemente, não torna a questão fácil.
Mas com certeza aponta o caminho.
Atenção, minha gente: é importante dizer, neste momento, que não estou advogando, aqui, a paralisação de qualquer ação destinada a ampliar o número de vagas no sistema prisional. A necessidade delas existe, é emergencial e urgentíssima. Não é possível conviver civilizadamente com as condições em que vivem os presos nos “xadrezes”, em tudo e por tudo degradantes de qualquer padrão humano.
Não. É preciso fazer todo o possível para pelo menos minimizar a tragédia enquanto decorre o tempo necessário a que as medidas estruturais aqui propostas surtam efeito.
Essa maturação é inerente a toda e qualquer política que vai à estrutura de um sistema.  Se examinarmos a que aqui proponho, veremos que ela se constitui na geração de um ciclo. Seus resultados aparecerão no médio e no longo prazo, à medida que este ciclo se for completando.
Em resumo, pessoal, o que estou querendo dizer, na verdade é o que sempre digo: a causa da superlotação carcerária é a quantidade desproporcional de criminosos que existe no Brasil.
Uso a palavra “desproporcional” porque a relação desse número com o da população é muito maior do que seria de se esperar em um país como o nosso.
Então, a cada bandido que se prende, surge outro (ou outros) no lugar. Nossa sociedade criou uma verdadeira “linha de produção de peças de reposição” do crime. Sua enorme produtividade é impossível de acompanhar, administrativamente.
Ora, como todas as demais, no mundo, essa produtividade depende diretamente da provisão de insumos.
No caso, o insumo principal é o jovem que as condições sociais e econômicas em que vive desiludiram completamente em relação a suas perspectivas de vida e de futuro. Sua alma é o campo fértil no qual o crime colhe seus frutos. Seu corpo é a peça de reposição dos que forem presos.
Aí, minha gente, está a causa do problema de que trata essa série.
Sabemos com certeza que esse jovem, em sua esmagadora maioria, tem boa índole. Não deseja o crime. Adere a ele por falta de alternativa, de esperança.
Além do mais, ele sabe que, embora até certo ponto glamourosa e rica, a vida criminosa será curta. Tem consciência de que quase certamente morrerá, de forma violenta, antes de completar 25 anos de idade.
Por tudo isso, prefere uma vida digna, ainda que modesta.
Portanto, atacar o problema carcerário na sua raiz consiste tão somente em devolver a esse jovem a esperança.
Sem ele, o exército criminoso perderá seu soldado.
E, como se sabe, nenhuma guerra se faz apenas com generais.
Cada jovem resgatado será uma vaga a menos que se necessitará no sistema prisional.
É mais fácil, custa mais barato, e é muito mais eficaz.
Só que é inovador. É diferente das medidas que “sempre foram assim”.
Por isso, para o gestor tradicional é difícil de assimilar.
Vai tirá-lo da zona de conforto, e da segurança proporcionada pelas medidas rotineiras. Vai obrigá-lo a romper paradigmas, não apenas de ações, mas também de reflexões, análises e conclusões. Em uma palavra, vai obrigá-lo a adotar uma visão crítica, e a agir de acordo com ela.
Todos sabemos como isso é difícil.
Mas, na minha opinião, não tem outro jeito.
Ou se vai por aí, ou chegaremos ao caos total.


quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Meu Ponto de Vista - 8 - População Carcerária - Parte II

A manchete da Gazeta dizia que a conta não fecha porque, nas palavras da mesma matéria, “o governo do estado prevê a entrega de 6.348 vagas em penitenciárias ou prisões provisórias até o fim da atual gestão, mas atualmente o número de presos em subdivisões da Polícia Civil passa de 13 mil”.
Uh-la-lá!
Então o sistema prisional não absorverá, até o final do governo, nem mesmo a metade dos presos que estão nas “cadeias públicas” hoje!
Vejamos: são (arredondemos) 13.000 presos. O sistema oferecerá vaga para 6.348. Sobrarão, nos “xadrezes”, nada menos do que 6.652.
Terminará a gestão e o problema continuará, mesmo tendo sido prometido pelo governador que zeraria esse número.
Por incrível que pareça, minha gente, essa é a boa notícia.
Eis a má: até o final do governo ingressarão nesse inferno mais um sem-número de pessoas.
Porque as polícias e guardas continuam prendendo, todos os dias. E levando pras delegacias. Que, não tendo para onde escoar, vão empilhando nos seus calabouços.
É verdade que alguns saem do sistema, mas esses são em número muito menor do que os que entram.
As cifras, portanto, só fazem crescer.
Então, anotem aí. Se o governo realmente conseguir assimilar 6.348 presos das delegacias no sistema prisional até o final do mandato, ainda assim o número deles que restará nelas será muito superior a 6.652.
Arrisco dizer que permanecerá beirando os 13.000, isso se não for ainda maior.
Já aconteceu antes.
Em 2003 eles (os presos em “cadeias públicas”) eram 8.000. O governador Requião determinou a construção de presídios para abertura de 9.000 vagas no sistema. Quem pesquisar nos jornais da época vai encontrar a declaração bombástica dele: “O problema prisional das delegacias estará resolvido pelos próximos 20 anos!”.
Pois ele cumpriu a palavra. Criou as 9.000 vagas. Foram construídas e entregues 10 unidades, com capacidade para 900 presos cada uma.
Mas não cumpriu a profecia.
No final do governo, todas as 9.000 estavam ocupadas. E, nas delegacias, o número de presos havia subido dos 8.000 para 12.000!
Agora, com quase dois anos do novo governo, “passa de 13.000”...
É, o jornal tem razão. A conta não fecha.
E, digo eu, jamais fechará.
Não pensem, entretanto, que esse é um problema paranaense. Longe disso. Com cores mais ou menos vivas, está presente em todos os cantos deste nosso Brasil.
Alguns poderão pensar: “Azar dos presos, quem mandou praticar crime? Agora que agüentem ficar nessa condição desumana, pra aprender.”
Este raciocínio, mesmo que estivesse correto – E NÃO ESTÁ![1] – ainda assim só prejudica a todos nós.
Porque esse cidadão, que está preso, um dia vai sair e voltar ao nosso convívio. E podem vocês ter a mais absoluta certeza de que ele não terá seguido o conselho. Não terá aprendido. Pelo menos não terá aprendido nada de bom. Ao contrário. Com certeza quase absoluta sairá muito pior do que entrou.
Muito bem.
Na primeira parte desta postagem, descrevi o problema.
Disse, ali, que a solução era difícil.
Agora, na segunda, estou procurando dar uma idéia de o quanto difícil é.
A solução mais simplista (“Faltam vagas? Criem-se vagas!”) simplesmente não funciona!
E as coisas só fazem piorar!
Então, que diabos fazer?
Não perca o próximo - e eletrizante - capítulo.

(continua...)


[1]Não vou falar sobre isso agora, porque esse não é o tema, aqui. Talvez faça um Ponto de Vista específico, em outra ocasião para mostrar a razão pela qual, na minha opinião, este pensamento, além de extremamente equivocado, só atrapalha.

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Pingos

Inauguro hoje um novo tipo de postagem.
Todo dia, lendo os jornais, me ocorrem opiniões sobre as mais variadas notícias.
Pois vou usar este espaço para deixá-las registradas.
Pretendo que tenham a forma de comentários curtos (o que, para mim, será uma façanha...). Por isso o nome da série: Pingos.
Vamos lá.

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1)      Sobre a morte, domingo, 09/09/2012, do ex-prefeito de Curitiba, Ivo Arzua Pereira.

Primeiramente, meus respeitos à família. São devidos, independentemente de qualquer coisa.
Mas vamos ao comentário.
Pelo que eu saiba, foi um bom prefeito. No entanto, a tendência que se lê é de endeusá-lo. Há um cronista, inclusive, que se queixa de que os atuais candidatos não estão à sua altura. Tem sempre um jornalista saudosista pra achar que já não se fazem mais políticos como antigamente.
Eu discordo. Acho que muitas vezes é inclusive o contrário.
Mas isso não esconde o mais importante: estão tentando diminuir a participação do falecido na instauração da ditadura mais implacável que o Brasil já conheceu, a do Ato Institucional nº 5, editado com sua assinatura, na qualidade de Ministro da Agricultura, em dezembro de 1968.
Desculpem, mas para isso não há perdão ou atenuante. Nem a morte.
Há momentos na vida, e na história, em que as pessoas precisam se posicionar. Ivo Arzua Pereira inegavelmente o fez. Com absoluta clareza. E optou pela sombra, ao invés da luz.
Ali, já vigorava um regime de exceção. A escolha nem era entre democracia e ditadura, mas entre mais ou menos ditadura.
Se cresse na liberdade, minimamente que fosse, o ex-prefeito deveria ter ido pra casa e se recusado a assinar aquela excrescência.
Mas não o fez. Ao contrário, consta que na reunião ministerial que a aprovou, foi um de seus mais entusiasmados defensores.
Não existe meio-termo. Quando se é a favor da cassação das liberdades de um povo, não importa se é por um dia, por um ano ou por um século. Trata-se de uma posição de vida. Uma profissão-de-fé.
É isto o que passará para a história do Brasil. Quando chamado a escravizar sua população, Ivo Arzua disse sim.
Nada do que possa ter feito antes ou depois tem força suficiente para amenizar este fato.

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2)      Notícia da Agência “O Globo”, reproduzida pela Gazeta do Povo de hoje, 11/09/2012, na seção “Mundo”, sob a manchete “Governos Aliados de Chávez Temem Candidato da Oposição”:

“A divulgação, nas últimas semanas, de pesquisas que apontam o desgaste do presidente Hugo Chávez na campanha eleitoral venezuelana e o conseqüente fortalecimento do candidato único da oposição, Henrique Capriles Radonski, provocou preocupação em vários governos da região...”

Ué, tem pesquisas eleitorais na Venezuela?
E elas podem indicar chance de vitória da oposição?
Pior: pode haver vitória da oposição?
Mas como? Não é a Venezuela que, segundo essa mesma imprensa, é uma ditadura caudilhesca?
Lá as cartas não são marcadas, como em qualquer ditadura?
As eleições não são manipuladas?
Que ditador fajuto é esse que permite pesquisas que o desfavorecem e uma eleição capaz de deixar a oposição sonhar em ganhar?
Estranho...



Meu Ponto de Vista - 8 - População Carcerária - Parte I

No dia 26 de junho passado a Gazeta do Povo, maior jornal do Paraná, publicou matéria de capa sobre a superlotação das cadeias nas delegacias de polícia. A manchete era enorme: “A Conta não Fecha”.
É verdade. E nem fechará.
Para melhor compreensão do meu comentário por quem não é estudioso da matéria, cabe pequeno intróito.
Pela lei, ninguém pode ficar preso em delegacias de polícia.
O que ocorre é que essas são as unidades nas quais se encontra a Polícia Civil, encarregada pela Constituição Brasileira de efetuar as investigações, elucidar os crimes e indicar seus autores ao Poder Judiciário, para que sejam julgados.
A corporação que fez uma prisão, qualquer que seja ela (Polícia Militar, Guarda Municipal, ou mesmo a própria Polícia Civil) é obrigada a encaminhar o preso à delegacia, para que ali sejam efetuados os procedimentos iniciais da investigação do suposto delito que causou sua detenção.
O autor da prisão encerra sua participação no episódio entregando o preso à autoridade competente, na delegacia.
Esta autoridade fica, então, com a custódia do preso, a qual deve durar exclusivamente o tempo necessário à conclusão dos referidos procedimentos iniciais.
Quer dizer, 24, 48 horas, no máximo.
Nesse período as delegacias precisam de instalações apropriadas para manter esse preso. É por isso que em geral elas possuem celas, popularmente chamadas de “xadrez”. A imprensa adotou o nome “cadeia pública”.
Concluído o trabalho da Polícia, o Estado deve encaminhar a pessoa a uma unidade adequada do sistema prisional.
Por “unidade adequada” entenda-se um presídio. São instalações inteiramente distintas, cuja finalidade específica é abrigar pessoas privadas de liberdade, pelo tempo em que isso for necessário.
Estão devidamente aparelhados para essa função, atendendo, inclusive, às determinações da Lei de Execuções Penais, que rege a matéria. Ali trabalham pessoas contratadas e treinadas também especificamente para isso.
Acontece que todos os presídios que compõe o sistema prisional do Estado estão lotados. Então, não há vagas para colocar os presos que são encaminhados para as delegacias.
E a polícia prendendo. Todo dia. E levando pra delegacia.
Resultado: os presos vão se empilhando, cada vez mais.
E o “xadrez” ficando superlotado. Virando verdadeiro depósito de gente.
200 pessoas onde cabem 30. Ou 150 onde cabem 10. E assim vai.
Claro que as doenças proliferam. As revoltas também. E as fugas.
E o policial civil, que tinha que estar na rua, trabalhando, investigando crimes, fica o dia todo cuidando dos presos do “xadrez”. Até porque mesmo quando está tudo bem (quase nunca...) eles precisam comer, e alguém precisa providenciar e servir a comida.
Fecha-se o círculo. A Polícia Civil, que já tem efetivo insuficiente, emprega-o na carceragem, o que faz com que as investigações não andem, os inquéritos não terminem e por isso não sejam encaminhados à Justiça. Quanto mais demora o processo, mais tempo leva para o criminoso ser julgado, prolongando o seu tempo dentro do “sistema”.
E quanto mais tempo ele fica, mais se agrava a superlotação.
E assim por diante.
Bem.
Este é o problema.
Qual a solução?
Pois é. É difícil pacas, mas eu tenho uma opinião.
Um simples ponto-de-vista.
                                            
                                            (continua...)

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Curitiba: Eleições e Segurança

Permitam-me falar sobre eleições municipais, o tema do momento.
Estou preocupado com as posições dos candidatos a prefeito de Curitiba na questão da segurança pública.
Me assusta, para falar a verdade, a completa ausência de conhecimento, por parte da maioria deles, acerca do tema.
Tomo como exemplo o atual mandatário, Luciano Ducci, candidato à reeleição.
Sua proposta consiste unicamente em prestigiar as iniciativas do Governo do Estado. Apóia mais Unidades Paraná Seguro e módulos móveis da polícia.
Comete, com todo o respeito, um duplo erro.
Em primeiro lugar porque o entendimento acima pressupõe segurança pública como assunto exclusivamente policial, conceito hoje ampla e consensualmente superado, no Brasil, em todas as esferas.
O segundo erro, decorrência direta do primeiro, importa em desconhecer o papel primordial que o município – e principalmente o município – tem a desempenhar nessa área: o da prevenção.
Não dá mais pra se esquivar jogando a responsabilidade nas costas do governador, só porque ele é que comanda as polícias.
Elas cuidam somente de uma parte do problema. E, arrisco dizer, da parte que menos impacto produz na reversão do quadro de violência e criminalidade que assola o Brasil.
Mas é exatamente isso o que faz o Ducci.
Com uma honrosa exceção, os demais candidatos tampouco conhecem a real dimensão do problema.
Um fala apenas em módulos da guarda municipal e vigias de quarteirão. Mal roça a superfície.
Outros se escondem atrás de palavras ocas.
Tem até um deles, de um partido nanico, que apregoa que a solução para a segurança é a “palavra de Deus”. Promete usar dinheiro público para financiar pastores evangélicos nas penitenciárias!
Nada contra nenhuma crença, vejam bem, mas se isso é uma proposta de governo, de política pública, então sou eu quem não entendeu nada.
Na verdade, quem estudar um pouco mais o assunto vai perceber que, no contexto brasileiro atual, o que é mais importante cabe ao município, e só ao município, fazer.
E isso, como disse, é a prevenção.
À polícia compete inibir o crime pela presença ostensiva (militar) e prender os criminosos (civil). Isso ajuda – e muito –, mas não resolve. Se resolvesse, já estaria pelo menos muito melhor, a julgar pelo número de bandidos presos. Todas as cadeias do país estão superlotadas!
 Prevenção significa dissuadir os jovens das comunidades mais desassistidas, do ponto de vista social e econômico, de optar pela carreira do crime.
Está largamente comprovado que a imensa maioria deles o faz por ausência de alternativa.
A sociedade lhes nega todos os elementos de cidadania, desde os mais elementares. Frustra-lhes, por completo, a perspectiva de construir uma vida digna, mesmo que modesta. Empurra-os, inexoravelmente, para a marginalidade.
Eu poderia gastar aqui uma enorme quantidade do tempo de vocês descrevendo com minúcias cada um dos inúmeros mecanismos através dos quais isso se dá.
Não vou fazê-lo, porém, porque esse texto ficaria ilegível de tão longo.
Mas acreditem em mim. É exatamente isso que acontece.
Por outro lado, está também demonstrado na prática que se é oferecido a esse jovem em situação de risco de cair na criminalidade – ou mesmo, em grande parte das vezes, que já o tenha feito – uma nova oportunidade, um outro caminho concreto, uma perspectiva, ele os adota com entusiasmo.
Então, meus amigos, ocorre o milagre das coisas simples. Cada menino, cada menina, que você afastar da criminalidade, será uma contribuição que você estará dando para a diminuição dos respectivos índices.
Significa atacar o mal na sua raiz. Ir às causas, ao invés de apenas combater as consequências.
Prevenção.
Simples. Óbvio, até.
Mas não fácil. Longe disso.
Exige, antes de tudo, inteligência para perceber esse conjunto de circunstâncias. Depois, coragem e disposição para romper com as platitudes longamente estabelecidas, saindo da zona de conforto de responsabilizar terceiros. Isso implica a difícil tarefa de assumir responsabilidades nem sempre agradáveis.
É preciso também integridade. São medidas que, como tudo o que busca atacar a estrutura de um problema complexo e multifacetado, certamente não produzem resultado a curto prazo. Ou seja, possuem duvidoso valor eleitoral. Para o gestor tradicional, preocupado tão somente com a próxima eleição, é sempre mais fácil a política espetaculosa, que mostra efeito pirotécnico, mesmo que pouco eficaz. Basta que dure até ela (a eleição) chegar.
E então, por último, para transformar esses requisitos todos em política pública, é fundamental uma grande capacidade de liderança.
Entendido genericamente o que é preciso fazer, resta definir como fazê-lo.
Primeiro desafio: definir quais são as ações concretas necessárias para oferecer ao público alvo (jovens em situação de risco econômico-social) o novo caminho alternativo preconizado.
Segundo: organizá-las e aplicá-las.
Sabemos que a mola propulsora mestra do jovem em direção à marginalidade é a falta de cidadania. Esta, por sua vez, gera inacessibilidade a oportunidades, carência de perspectiva, culminando com a perda da própria esperança.
A missão de vencer os desafios postos acima traz consigo a necessidade de reverter essa situação, invertendo, com isso, a lógica perversa.
Ou seja: é preciso restaurar a cidadania, única chave que abrirá para ele, jovem, as portas até aqui hermeticamente cerradas.
Em outras palavras, falo de inserção social.
Refiro-me a ações que viabilizem educação (formação e capacitação), cultura, esporte, lazer, saúde, sociabilidade, convivência saudável, identidade, pertencimento, auto-estima.
O desdobramento é de evidência ofuscante: ninguém possui condições melhores (ou mesmo iguais) do que o município, para implementar essas ações.
É o gestor local quem está em contato direto com a população; é ele quem conhece de perto a realidade dos locais onde as medidas devem ser tomadas, e ali pode estar física e facilmente presente.
É a ele, por outro lado, que as pessoas possuem acesso rápido e desburocratizado. E, por isso, é a ele que podem formular as demandas “olho no olho”.
Pois bem. Quem teve a paciência de me ler até aqui, e prestou atenção, percebeu que, muito embora o tema seja segurança pública, as ações de prevenção  envolvem todas as áreas da administração.
Afinal, estamos falando, por exemplo, de saúde, educação, esporte, cultura, trabalho, etc.
E isto porque segurança é um assunto altamente complexo, multifacetado. Qualquer simplificação é inútil, e só atrapalha.
É fundamental uma abordagem multidisciplinar, profunda e dedicada.
O que deve fazer, então, o município que realmente queira se comprometer com a melhoria dos níveis de segurança de sua população?
Em primeiro lugar, exigirá que cada secretaria tenha na segurança um objetivo mediato. Todas deverão voltar um olhar para o tema.
Em segundo, empregá-las-á todas, de forma combinada, para esse fim.
Outra vez, estamos falando de algo simples, até óbvio, mas bastante difícil de realizar.
É preciso romper com costumes amplamente consolidados. Trata-se de um modo novo de governar. Nossas estruturas estão acostumadas à administração segmentada, em que cada gestor cuida de seu quintalzinho, tão adequada à fogueira de vaidades que freqüenta o poder, e aos planos e projetos pessoais de cada um.
Esses gestores, os secretários municipais, por evidente, não possuem hierarquia entre si, de forma que é impossível a qualquer deles comprometer os demais.
Só há, portanto, um meio para obter a integração acima preconizada. O Prefeito, ele próprio, e mais ninguém, deve comandar o processo. Sem sua liderança militante, nada se concretizará.
Um Gabinete de Gestão Integrada, coordenado com energia e firmeza pelo chefe do executivo, composto por todas as secretarias a ele subordinadas, e dedicado a idealizar e concretizar ações sociais que as envolvam em conjunto, total ou parcialmente, é fortíssimo instrumento capaz de dar forma, conteúdo, consequência, eficácia, eficiência, concretude e realidade ao propósito de colocar o município, de fato, no mapa da segurança pública, exercendo, da maneira correta, o papel que indeclinavelmente é seu.
Claro, é preciso fortalecer de várias maneiras a Guarda Municipal, que também possui um protagonismo importante, presente e futuro, nesse cenário.
Mas esse é tema para outra postagem, que esta já está longa demais.
Muito bem.
Lembram da honrosa exceção, entre os candidatos a prefeito de Curitiba, que mencionei acima?
Pois é.
Apenas o Gustavo Fruet, no seu programa de governo, dá mostras de haver entendido minimamente o que eu acima procurei expor.
Cabe conferir.
Importante: este não é, absolutamente, espaço de propaganda eleitoral.
Portanto, friso que não estou cabalando voto de ninguém.
Mas acho indispensável, fundamental mesmo, fazer o registro.
Não só porque é verdadeiro. Mas também porque é necessário, como informação.